As pétalas
brotam das flores
a minha saudade
Enquanto juntamos retalhinhos...ouvimos doces melodias...
terça-feira, 30 de junho de 2015
segunda-feira, 29 de junho de 2015
Fala-se de amor para falar
de muitas coisas que
entretanto nos sucedem.
de muitas coisas que
entretanto nos sucedem.
Para falar do tempo,
para falar do mundo
usamos o vocabulário preciso
que nos dá o amor.
Eu amo-te.
Quer dizer:
eu conheço melhor
as estradas que servem
o meu território.
Quer dizer:
eu estou mais acordado,
não me enredo nas silvas,
não me enredo,
não me prendo nos cardos,
não me prendo.
Quer também dizer:
Amar-te either cada dia mais,
estarei cada dia mais acordado.
Porque este amor não pára.
E para falar da morte
da enorme definitiva
irremediável morte,
do carro tombado na valeta
sacudindo uma última vez
(fragilidade)
as rodas acendedoras de caminhos
eu lembraria que o amor nos dá
uma forma difícil de coragem,
uma difícil,
inteira possessão de nós próprios,
quando aveludada a morte
surge e nos reclama.
Porque eu amo-te,
quer dizer,
eu estou atento às coisas regulares
e irregulares do mundo.
Ou também:
eu envio o amor
sob a forma de muitos
olhos e ouvidos a explorar,
a conhecer o mundo.
Porque eu amo-te,
isto é,
eu dou cabo da escuridão do mundo.
Porque tudo se escreve com a tua letra.
Fernando Assis Pacheco
para falar do mundo
usamos o vocabulário preciso
que nos dá o amor.
Eu amo-te.
Quer dizer:
eu conheço melhor
as estradas que servem
o meu território.
Quer dizer:
eu estou mais acordado,
não me enredo nas silvas,
não me enredo,
não me prendo nos cardos,
não me prendo.
Quer também dizer:
Amar-te either cada dia mais,
estarei cada dia mais acordado.
Porque este amor não pára.
E para falar da morte
da enorme definitiva
irremediável morte,
do carro tombado na valeta
sacudindo uma última vez
(fragilidade)
as rodas acendedoras de caminhos
eu lembraria que o amor nos dá
uma forma difícil de coragem,
uma difícil,
inteira possessão de nós próprios,
quando aveludada a morte
surge e nos reclama.
Porque eu amo-te,
quer dizer,
eu estou atento às coisas regulares
e irregulares do mundo.
Ou também:
eu envio o amor
sob a forma de muitos
olhos e ouvidos a explorar,
a conhecer o mundo.
Porque eu amo-te,
isto é,
eu dou cabo da escuridão do mundo.
Porque tudo se escreve com a tua letra.
Fernando Assis Pacheco
sábado, 27 de junho de 2015
sexta-feira, 26 de junho de 2015
quinta-feira, 25 de junho de 2015
No primeiro dia que saí contigo
disseste que o teu trabalho era estranho.
Mais nada. Todavia, eu sentia
a pele a rasgar-se como trapos
de cada vez que me tocavas com a mão.
E os teus olhos pareciam-me punhais
a fazer-me doer os meus.
Daí para a frente foi sempre a mesma coisa:
tu orgulhavas-te da tua arte,
mais subtil e directo em cada dia
e eu nunca percebia nada.
Mas agora sei. Já conheço o teu ofício:
Atirador de facas. A mais certeira
atiraste-ma ao coração.
disseste que o teu trabalho era estranho.
Mais nada. Todavia, eu sentia
a pele a rasgar-se como trapos
de cada vez que me tocavas com a mão.
E os teus olhos pareciam-me punhais
a fazer-me doer os meus.
Daí para a frente foi sempre a mesma coisa:
tu orgulhavas-te da tua arte,
mais subtil e directo em cada dia
e eu nunca percebia nada.
Mas agora sei. Já conheço o teu ofício:
Atirador de facas. A mais certeira
atiraste-ma ao coração.
segunda-feira, 22 de junho de 2015
sábado, 20 de junho de 2015
O Amor é...
O amor é o início. O amor é o meio. O amor é o fim. O amor faz-te pensar, faz-te sofrer, faz-te agarrar o tempo, faz-te esquecer o tempo. O amor obriga-te a escolher, a separar, a rejeitar. O amor castiga-te. O amor compensa-te. O amor é um prémio e um castigo. O amor fere-te, o amor salva-te, o amor é um farol e um naufrágio. O amor é alegria. O amor é tristeza. É ciúme, orgasmo, êxtase. O nós, o outro, a ciência da vida.O amor é um pássaro. Uma armadilha. Uma fraqueza e uma força.
O amor é uma inquietação, uma esperança, uma certeza, uma dúvida. O amor dá-te asas, o amor derruba-te, o amor assusta-te, o amor promete-te, o amor vinga-te, o amor faz-te feliz.
O amor é um caos, o amor é uma ordem. O amor é um mágico. E um palhaço. E uma criança. O amor é um prisioneiro. E um guarda.
Uma sentença. O amor é um guerrilheiro. O amor comanda-te. O amor ordena-te. O amor rouba-te. O amor mata-te.
O amor lembra-te. O amor esquece-te. O amor respira-te. O amor sufoca-te. O amor é um sucesso. E um fracasso. Uma obsessão. Uma doença. O rasto de um cometa. Um buraco negro. Uma estrela. Um dia azul. Um dia de paz.
O amor é um pobre. Um pedinte. O amor é um rico. Um hipócrita, um santo. Um herói e um débil. O amor é um nome. É um corpo. Uma luz. Uma cruz. Uma dor. Uma cor. É a pele de um sorriso.
Joaquim Pessoa, in 'Ano Comum'
sexta-feira, 19 de junho de 2015
Amo-te Por Todas as Razões e Mais Uma
Por todas as razões e mais uma. Esta é a resposta que costumo dar-te quando me perguntas por que razão te amo. Porque nunca existe apenas uma razão para amar alguém. Porque não pode haver nem há só uma razão para te amar.Amo-te porque me fascinas e porque me libertas e porque fazes sentir-me bem. E porque me surpreendes e porque me sufocas e porque enches a minha alma de mar e o meu espírito de sol e o meu corpo de fadiga. E porque me confundes e porque me enfureces e porque me iluminas e porque me deslumbras.
Amo-te porque quero amar-te e porque tenho necessidade de te amar e porque amar-te é uma aventura. Amo-te porque sim mas também porque não e, quem sabe, porque talvez. E por todas as razões que sei e pelas que não sei e por aquelas que nunca virei a conhecer. E porque te conheço e porque me conheço. E porque te adivinho. Estas são todas as razões.
Mas há mais uma: porque não pode existir outra como tu.
Joaquim Pessoa, in 'Ano Comum'
quinta-feira, 18 de junho de 2015
DEIXAR NAS TUAS MÃOS
Deixar nas tuas mãos tudo o que eu amo
nadar no lago verde dos teus olhos
em teu corpo saber como eu me chamo
queimar manhãs de incenso ou de petróleos
chamar por ti uivar como se um lobo
devorasse corças brancas no meu peito
e o coração inteiro fosse pouco
para amar ou morrer de qualquer jeito
saber que esse punhal que o vento ergue
acima do esplendor da amendoeira
é apenas o tempo que se perde
ao acender de dia uma fogueira
e naufragar em ti como se eu fosse
um mastro habituado a correr mundo
e no mar do teu ventre inquieto e doce
mergulhar esta noite até ao fundo.
Deixar nas tuas mãos tudo o que eu amo
nadar no lago verde dos teus olhos
em teu corpo saber como eu me chamo
queimar manhãs de incenso ou de petróleos
chamar por ti uivar como se um lobo
devorasse corças brancas no meu peito
e o coração inteiro fosse pouco
para amar ou morrer de qualquer jeito
saber que esse punhal que o vento ergue
acima do esplendor da amendoeira
é apenas o tempo que se perde
ao acender de dia uma fogueira
e naufragar em ti como se eu fosse
um mastro habituado a correr mundo
e no mar do teu ventre inquieto e doce
mergulhar esta noite até ao fundo.
quarta-feira, 17 de junho de 2015
Depois da adrenalina, o sono. A alma a pousar, lenta, na almofada de
nada querer. O dever cumprido, o sorriso obsceno de quem sabe que fez
bem. De quem sabe que fez a diferença. Viver é ter a certeza de que é
possível fazer a diferença, obrigar à mudança. Nem que seja de uma só
pessoa, nem que seja de um só gesto, nem que valha um só abraço. Viver é
fazer a diferença. As palavras que se perdem da boca e que se deixam
cair no que não se diz. Quero tanto dizer o que ninguém disse. Amo-te como nunca ninguém te disse. Amo-te como é impossível dizer. E está dito.
Pedro Chagas
Freitas in 'Queres casar comigo todos os dias, Bárbara?'
Pedro Chagas
Freitas in 'Queres casar comigo todos os dias, Bárbara?'
terça-feira, 16 de junho de 2015
(...)
É triste ir pela vida como quem
regressa e entrar humildemente por engano pela morte dentro
É triste no outono concluir
que era o verão a única estação
Passou o solitário vento e não o conhecemos
e não soubemos ir até ao fundo da verdura
como rios que sabem onde encontrar o mar
e com que pontes com que ruas com que gentes com que montes conviver
através de palavras de uma água para sempre dita
Mas o mais triste é recordar os gestos de amanhã
Triste é comprar castanhas depois da tourada
entre o fumo e o domingo na tarde de novembro
e ter como futuro o asfalto e muita gente
e atrás a vida sem nenhuma infância
revendo tudo isto algum tempo depois
A tarde morre pelos dias fora
É muito triste andar por entre Deus ausente
É triste ir pela vida como quem
regressa e entrar humildemente por engano pela morte dentro
É triste no outono concluir
que era o verão a única estação
Passou o solitário vento e não o conhecemos
e não soubemos ir até ao fundo da verdura
como rios que sabem onde encontrar o mar
e com que pontes com que ruas com que gentes com que montes conviver
através de palavras de uma água para sempre dita
Mas o mais triste é recordar os gestos de amanhã
Triste é comprar castanhas depois da tourada
entre o fumo e o domingo na tarde de novembro
e ter como futuro o asfalto e muita gente
e atrás a vida sem nenhuma infância
revendo tudo isto algum tempo depois
A tarde morre pelos dias fora
É muito triste andar por entre Deus ausente
segunda-feira, 15 de junho de 2015
Carta à mulher inteligente que eu amo.
Hoje escrevo à mulher inteligente que eu amo.
Hoje escrevo-te para te dizer que até quando falhas acertas em cheio, que até quando choras tens o sorriso mais lindo do mundo. Hoje escrevo-te para me escrever a mim – para me dizer que sou o cabrão mais abençoado que a terra conhece, o gajo mais feliz que o planeta há-de ser capaz de conhecer. Hoje escrevo-te para te poder dizer o que não sei dizer, o que palavra alguma há-se ser capaz de dizer. Porque não se diz o que nos une, não se diz o que nos somos. Não se diz o que teu olhar diz no meu, o que o meu olhar entra no teu. Não se diz o que te quero dizer. E está tudo dito.
Hoje escrevo à mulher inteligente que eu amo.
Hoje escrevo-te para te dizer que é a inteligência o melhor tempero. Que é quando me abres os problemas com as tuas soluções – e não quando me abres as pernas – que realmente me sinto excitado. Que é quando me contas o que te passa na mente – as ideias que te invadem, os sonhos que te enchem, a vida que exiges viver – que definitivamente me sei teu escravo, indecente. Que é pornográfica de tão brilhante a tua cabeça, que é indecoroso de tão belo o que vês para além dos olhos. Hoje escrevo-te para te falar disso – daquilo que és diante daquilo que eu sou. Hoje escrevo-te para te explicar o que é a mulher inteligente. Senta-te, aprecia. E por favor pensa. Nunca pares de pensar. Delícia.
Sou doente pela mulher inteligente.
Sou fanático pela mulher inteligente. Sou viciado na inteligência da mulher inteligente. Preciso dela, exijo-a a toda a hora, persigo-a como um cão com fome persegue o osso. Sou obcecado pela mulher inteligente. A mulher inteligente é a criação suprema de Deus. A mulher inteligente é o próprio Deus. A mulher inteligente, suspeito, deve ser mesmo uma forma superior do próprio Deus. Até Deus tem inveja da mulher inteligente. Meu Deus.
A mulher inteligente despreza o que a mulher não-inteligente ama.
A mulher inteligente não quer saber da conta bancária, não quer saber da marca do carro, da maquilhagem na cara. A mulher inteligente veste Prada a cada vez que fala, a cada vez que pensa. A mulher inteligente faz do que é um estilo, do que defende uma lei, do que parece uma moda. A mulher inteligente faz do tesão um estado de alma. A mulher inteligente dá-me tesão. Mmmm.
Partilhar a vida com uma mulher inteligente é a única forma de partilha possível.
Só com ela consigo partilhar, só a ela consigo dizer tudo o que sinto, tudo o que sou. Só ela saberá como eu sei – e depois de pensar um pouco saberá muito melhor do que eu sei – aquilo que eu quero dizer com aquilo que eu estou a dizer. Sim: a mulher inteligente sabe mais do seu homem do que alguma vez o próprio homem saberá. E só um homem burro se sente inferiorizado com uma mulher inteligente. Viver com uma mulher inteligente é um milagre que só mentes pequenas não gozam à grande. Viver com uma mulher inteligente é um privilégio que muito poucos estão à altura de degustar. Não é qualquer um que está à altura de rastejar e de ser rastejado. Viver com uma mulher inteligente não é uma humilhação – é uma diversão, uma animação, um verdadeiro vulcão. E é só dentro de um vulcão que a temperatura aquece. Ai.
A mulher inteligente aquece – as outras nem aquecem nem arrefecem.
A mulher inteligente é inteligente na pele, nos lábios, nas orelhas, no nariz, no rabo. A inteligência da mulher inteligente alastra-se, contrasta-se. A mulher inteligente lambe como se lesse Dostoiévski, fornica como se citasse Proust, abraça como se tivesse descoberto a cura para a morte. E é: a cura para a morte está em abraçar como se fosse a cura, em fornicar como se fosse Proust, em lamber como se fosse Dostoiévski. A mulher inteligente faz de tudo o que faz um acto inteligente. A mulher inteligente, apesar de ser inteligente comó catano, não deixa de ser selvagem comó catano. Nada é mais selvagem do que a inteligência da mulher inteligente. A inteligência da mulher inteligente é animalesca, anárquica, sedenta, esfomeada, predadora, insaciável. Sem deixar de ser racional, organizada, consolada, vítima, realizada. A mulher inteligente é os dois lados de todo o lado. A mulher inteligente é todo o lado de todos os lados. A inteligência da mulher inteligente não tem rei nem roque – e é por isso que ela é uma rainha, uma estrela, a senhora de todas as senhoras. A mulher inteligente não tem um pingo de vergonha. Mesmo que seja tímida, mesmo que não mostre, de todo, a todos, aquilo que é: a mulher inteligente não tem um pingo de vergonha. É uma desavergonhada da pior espécie, uma descarada sem remédio. A mulher inteligente é a pêga preferida do seu homem – que é, claro está, o único cliente que ela admite na sua inteligência. A mulher inteligente não tem dono nem é dona – mas gosta de mandar e de ser mandada, de saltar e de ser saltada, de dançar e de ser dançada. A mulher inteligente exige ser seduzida a toda a hora – porque tudo o que ela faz, a toda a hora, é seduzir. Até um arroto de uma mulher inteligente seduz – de tão inteligente que é. A mulher inteligente seduz com tudo o que faz, a toda a hora em que o faz, de toda a maneira que o faz. E nada é mais certo do que isso: se a mulher inteligente o faz é porque era assim que tinha de ser feito. Bem feita.
Hoje apetece-me escrever à minha mulher inteligente e dizer-lhe que tem em si todas as obras-primas da História da arte.
Hoje apetece-me escrever-te e dizer-te que a vida só existe para que tu possas estar viva. Hoje apetece-me dizer-te, sim, que tudo o que tenho para te dizer já foi dito. Mas que o mais importante do que te quero dizer é o que ficou por dizer. Digo-to ao ouvido daqui a pouco.
Pedro Chagas Freitas
Hoje escrevo à mulher inteligente que eu amo.
Hoje escrevo-te para te dizer que até quando falhas acertas em cheio, que até quando choras tens o sorriso mais lindo do mundo. Hoje escrevo-te para me escrever a mim – para me dizer que sou o cabrão mais abençoado que a terra conhece, o gajo mais feliz que o planeta há-de ser capaz de conhecer. Hoje escrevo-te para te poder dizer o que não sei dizer, o que palavra alguma há-se ser capaz de dizer. Porque não se diz o que nos une, não se diz o que nos somos. Não se diz o que teu olhar diz no meu, o que o meu olhar entra no teu. Não se diz o que te quero dizer. E está tudo dito.
Hoje escrevo à mulher inteligente que eu amo.
Hoje escrevo-te para te dizer que é a inteligência o melhor tempero. Que é quando me abres os problemas com as tuas soluções – e não quando me abres as pernas – que realmente me sinto excitado. Que é quando me contas o que te passa na mente – as ideias que te invadem, os sonhos que te enchem, a vida que exiges viver – que definitivamente me sei teu escravo, indecente. Que é pornográfica de tão brilhante a tua cabeça, que é indecoroso de tão belo o que vês para além dos olhos. Hoje escrevo-te para te falar disso – daquilo que és diante daquilo que eu sou. Hoje escrevo-te para te explicar o que é a mulher inteligente. Senta-te, aprecia. E por favor pensa. Nunca pares de pensar. Delícia.
Sou doente pela mulher inteligente.
Sou fanático pela mulher inteligente. Sou viciado na inteligência da mulher inteligente. Preciso dela, exijo-a a toda a hora, persigo-a como um cão com fome persegue o osso. Sou obcecado pela mulher inteligente. A mulher inteligente é a criação suprema de Deus. A mulher inteligente é o próprio Deus. A mulher inteligente, suspeito, deve ser mesmo uma forma superior do próprio Deus. Até Deus tem inveja da mulher inteligente. Meu Deus.
A mulher inteligente despreza o que a mulher não-inteligente ama.
A mulher inteligente não quer saber da conta bancária, não quer saber da marca do carro, da maquilhagem na cara. A mulher inteligente veste Prada a cada vez que fala, a cada vez que pensa. A mulher inteligente faz do que é um estilo, do que defende uma lei, do que parece uma moda. A mulher inteligente faz do tesão um estado de alma. A mulher inteligente dá-me tesão. Mmmm.
Partilhar a vida com uma mulher inteligente é a única forma de partilha possível.
Só com ela consigo partilhar, só a ela consigo dizer tudo o que sinto, tudo o que sou. Só ela saberá como eu sei – e depois de pensar um pouco saberá muito melhor do que eu sei – aquilo que eu quero dizer com aquilo que eu estou a dizer. Sim: a mulher inteligente sabe mais do seu homem do que alguma vez o próprio homem saberá. E só um homem burro se sente inferiorizado com uma mulher inteligente. Viver com uma mulher inteligente é um milagre que só mentes pequenas não gozam à grande. Viver com uma mulher inteligente é um privilégio que muito poucos estão à altura de degustar. Não é qualquer um que está à altura de rastejar e de ser rastejado. Viver com uma mulher inteligente não é uma humilhação – é uma diversão, uma animação, um verdadeiro vulcão. E é só dentro de um vulcão que a temperatura aquece. Ai.
A mulher inteligente aquece – as outras nem aquecem nem arrefecem.
A mulher inteligente é inteligente na pele, nos lábios, nas orelhas, no nariz, no rabo. A inteligência da mulher inteligente alastra-se, contrasta-se. A mulher inteligente lambe como se lesse Dostoiévski, fornica como se citasse Proust, abraça como se tivesse descoberto a cura para a morte. E é: a cura para a morte está em abraçar como se fosse a cura, em fornicar como se fosse Proust, em lamber como se fosse Dostoiévski. A mulher inteligente faz de tudo o que faz um acto inteligente. A mulher inteligente, apesar de ser inteligente comó catano, não deixa de ser selvagem comó catano. Nada é mais selvagem do que a inteligência da mulher inteligente. A inteligência da mulher inteligente é animalesca, anárquica, sedenta, esfomeada, predadora, insaciável. Sem deixar de ser racional, organizada, consolada, vítima, realizada. A mulher inteligente é os dois lados de todo o lado. A mulher inteligente é todo o lado de todos os lados. A inteligência da mulher inteligente não tem rei nem roque – e é por isso que ela é uma rainha, uma estrela, a senhora de todas as senhoras. A mulher inteligente não tem um pingo de vergonha. Mesmo que seja tímida, mesmo que não mostre, de todo, a todos, aquilo que é: a mulher inteligente não tem um pingo de vergonha. É uma desavergonhada da pior espécie, uma descarada sem remédio. A mulher inteligente é a pêga preferida do seu homem – que é, claro está, o único cliente que ela admite na sua inteligência. A mulher inteligente não tem dono nem é dona – mas gosta de mandar e de ser mandada, de saltar e de ser saltada, de dançar e de ser dançada. A mulher inteligente exige ser seduzida a toda a hora – porque tudo o que ela faz, a toda a hora, é seduzir. Até um arroto de uma mulher inteligente seduz – de tão inteligente que é. A mulher inteligente seduz com tudo o que faz, a toda a hora em que o faz, de toda a maneira que o faz. E nada é mais certo do que isso: se a mulher inteligente o faz é porque era assim que tinha de ser feito. Bem feita.
Hoje apetece-me escrever à minha mulher inteligente e dizer-lhe que tem em si todas as obras-primas da História da arte.
Hoje apetece-me escrever-te e dizer-te que a vida só existe para que tu possas estar viva. Hoje apetece-me dizer-te, sim, que tudo o que tenho para te dizer já foi dito. Mas que o mais importante do que te quero dizer é o que ficou por dizer. Digo-to ao ouvido daqui a pouco.
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